quinta-feira, 5 de agosto de 2021

homenagem a Olga Prats





ELEVAÇÃO


Sorriso

música

abraço:


os três se fundiam

nessa casa fora de casa

que era, em criança,

encontrar a Olga.


Corria na sua direção,

como se colocar os meus braços

à volta de quem assim tocava o piano

me concedesse um pouco de eternidade.


Os anos passaram,

fui a menos concertos, deixei de correr

mas o abraço, esse, permaneceu,

ensinando-me a cada momento que,

nesta finitude de ser,

há raras pessoas

que nos elevam para lá do tempo.






terça-feira, 18 de maio de 2021

interpelação

 


somos dois
no labirinto da tarde

e se experimentássemos a cintura
assistindo à morte das sereias?




sexta-feira, 7 de maio de 2021

(des)arrumações de papéis

 



os corpos eram início

 

todas as manhãs

tinham o nosso nome

 

e eu sabia o caminho para casa

somente guiado pelo teu gemido





sábado, 1 de maio de 2021

Layoff ou a esperança de desconfinar

 

nos rostos e nas cadeiras vagas
nos corpos caminhando lentos pelas ruas
nas placas vende-se arrenda-se for sale for rent
no asfalto despido nas carruagens do metro quase desertas 
no silêncio em que outrora se sentava
a artista de rua

na espera pelo cliente que não vem não chega
nas portas fechadas nas arrumações feitas
nos armazéns cheios e nas montras vazias
na mudez que aguarda em cada esquina
no semblante carregado de uma cidade
que era festa:

em todos os lugares
se impõe o espectro de gente
    descartada
        suspensa
            adiada

dessa gente a nossa gente
que pôs um volto já na vida

    sem saber se é já
    sem saber se é nunca.

abril de 2021

sábado, 2 de janeiro de 2021

homenagem a Carlos do Carmo (do baú - 2012)




Às oito entram na escola,

na mochila livros e o amanhã;

no chão um joelho que se esfola

é presságio duma coragem sã.

 

O novo torna-se ancião,

é natural que tudo finde;

querem lá saber de tal reflexão,

quem manda na terra é o berlinde.

 

No pátio a bola é rainha, criança...                                         (refrão)

meninas traçam a linha da trança;

esta gente é tua e minha  - esperança!

Que o tempo está na ponta da lança.         

 

Um quer ser futebolista,

a outra astronauta;

no fim somos todos fadistas:

a noss’ alma não nos falta.

 

Ó tu que brincas e saltas,

dá-me algo dessa magia,

traz-me essa nuvem tão alta

onde a vida é irmã do dia.